Inf. 522
O Tribunal indeferiu habeas corpus em que se pretendia fosse declarada a nulidade de decisão da Corte Especial do STJ que recebera denúncia, porque o mesmo Ministro que presidira o inquérito tornara-se, posteriormente, prevento para atuar como relator da ação penal. Alegava-se, na espécie, em síntese: a) ofensa aos princípios da impessoalidade dos atos de Administração da Justiça e da imparcialidade do magistrado; b) impossibilidade de ser fixada a competência pela prevenção quando o juiz tivesse atuado anteriormente no inquérito; c) vedação de tal prática pelo art. 8º do Pacto de San José da Costa Rica, que assegura, no âmbito criminal, a imparcialidade do julgador; d) inadmissibilidade, nos termos do art. 252 do CPP, da participação de juiz em processo no qual se manifestou anteriormente; e) inconstitucionalidade do art. 75 do CPP e seus reflexos nos regimentos internos do STJ e do STF por violação aos princípios do devido processo legal e da imparcialidade do magistrado. Inicialmente, o Tribunal rejeitou preliminar suscitada pelo Ministério Público - no sentido de ser inviável debater-se, no âmbito do habeas corpus, o impedimento ou a suspeição de magistrado por envolver análise aprofundada de elementos fático-probatórios -, haja vista não se estar, a rigor, discutindo impedimento ou suspeição do Ministro do STJ, mas uma tese de direito, constitucional. No ponto, o Min. Marco Aurélio, sustentando a envergadura maior do habeas corpus, asseverou ser suficiente que se tenha, na via direta ou indireta, o envolvimento da liberdade de ir e vir e a assertiva sobre a prática de um ato ilícito à margem da ordem jurídica, para concluir-se pela adequação do writ, e que, portanto, se no curso de uma ação penal, surge um questionamento sobre suspeição ou impedimento do relator, esse questionamento pode desafiar o habeas corpus.
HC 92893/ES, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 2.10.2008. (HC-92893)
Inf. 522
No mérito, afastaram-se todos os argumentos do impetrante. Ao salientar que as hipóteses de impedimento elencadas no art. 252 do CPP constituem um rol taxativo, considerou-se não ser possível interpretar extensivamente os incisos I e II desse artigo para entender que um juiz que atuou na fase pré-processual haja desempenhado função equivalente a de delegado de polícia ou membro do Ministério Público. Em seguida, afirmou-se que, no Brasil, não foi adotada a sistemática do juizado de instrução, na qual o magistrado exerce, simultaneamente, as funções próprias da autoridade policial e do parquet no que respeita à coleta das provas. Esclareceu-se que, no modelo acusatório aplicado em nosso ordenamento processual penal, caracterizado pela publicidade, pelo contraditório, pela igualdade entre as partes e pela neutralidade do juiz, quando o magistrado preside o inquérito, apenas atua como um administrador, um supervisor, um coordenador, no que tange à montagem do acervo probatório e às providências acautelatórias, agindo sempre por provocação, e nunca de ofício. Portanto, não exterioriza nenhum juízo de valor sobre os fatos ou as questões de direito, emergentes nessa fase preliminar, que o impeça de proceder com imparcialidade no curso da ação penal. Assim, o Judiciário, em nosso sistema processual penal, atua no inquérito para assegurar a observância dos direitos e liberdades fundamentais e dos princípios sobre os quais se assenta o Estado Democrático de Direito.
HC 92893/ES, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 2.10.2008. (HC-92893)
Magistrado: Atuação em Inquérito e Ausência de Impedimento para a Ação Penal - 3 Inf. 522
Ressaltou-se, também, que, no caso dos processos penais originários, que tramitam no STJ e no STF, regulados pela Lei 8.038/90, o relator escolhido, na forma regimental, terá as atribuições que a legislação processual confere aos juízes singulares, dentre as quais a de presidir o andamento do inquérito (art. 2º), e que, finda a instrução, o tribunal procederá ao julgamento, na forma determinada pelo regimento interno (art. 12, II). Ou seja, ainda que determinado relator seja escolhido, nos termos regimentais, para presidir à instrução, o julgamento é feito pelo órgão colegiado do tribunal prescrito pela Constituição para julgar a autoridade com prerrogativa de foro. Em razão disso, repeliu-se a afirmação de que seria inconstitucional o parágrafo único do art. 75 do CPP, que estabelece a prevenção do magistrado que houver determinado qualquer diligência anterior à denúncia ou à queixa para o julgamento da ação penal. Por fim, aduziu-se que eventuais incompatibilidades ou impedimento do Ministro relator do feito devem ser argüidos mediante o procedimento previsto no art. 112 do CPP, de espectro mais amplo quanto à apreciação de fatos e provas. Precedentes citados: HC 86579/ES (DJU de 31.8.2007); HC 68784/SP (DJU de 26.3.93); HC 73099/SP (DJU de 13.10.95); HC 67997/DF (DJU de 20.9.90); ADI 1517 MC/DF (DJU de 22.11.2002).
HC 92893/ES, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 2.10.2008. (HC-92893)
Nenhum comentário:
Postar um comentário